por: Francisco Gomes de Matos
A espiritualidade não é opção, é a realidade do homem.
O sagrado, o transcendente, não é, em geral, objeto de preocupação maior nas organizações. A visão transcendente decorre do embasamento cultural da empresa, sua filosofia, políticas e estratégias. Sendo a cultura que fundamenta o transcendente, vemos aí a essência do problema, já que administra-se muito pouco crenças, valores e princípios nas organizações. A ênfase situa-se no plano das estratégias de mercado, visando a resultados tangíveis, a curto e médio prazos, sem atenções maiores à perpetuidade, que envolve uma sólida imagem pública, só possível com valores consistentes e práticas coerentes. A empresa é concebida como um sistema econômico que atende às demandas do mercado e, com isso, obtém lucros. Todavia, é igualmente, um sistema social? Sim, pois estão envolvidos seres humanos. Há o reconhecimento rigoroso da valorização humana no processo produtivo? Diria ser bastante incipiente na prática, embora o discurso participativo seja hoje exuberante.
O autoritarismo está no inconsciente das organizações, comprometendo sua cultura e sua práxis. Formas de "escravidão branca" coexistem, em modernos escritórios e fábricas, com tecnologias sofisticadas e métodos de trabalho bem rotulados. O mecanicismo pós-revolução industrial ainda inspira propostas metodológicas neotaylorianas, em aparatosas "reengenharias", que subestimam o homem, em seu secular embate com a máquina. A cibernética, gerando a Sociedade Informacional, vem impondo um tipo de tirania sobre o espírito. Há uma espécie de esquizofrenização social em andamento, com gerações de jovens entregues vorazmente ao computador, quebrando-se os relacionamentos humanos, o sentido de equipe e reforçando o isolamento e o individualismo. Não que a tecnologia não seja bem vinda. Pelo contrário, desde que venha a serviço da dignificação do homem, de sua valorização como bem supremo. É o homem que é inteligente, é sentimento, é criativo. É ele que exerce a função nobre da decisão. É ele que deve ser feliz e deve realizar o transcendente.
Quando a empresa é vista exclusivamente como sistema econômico, a lógica é a do lucro, lucro, lucro, não havendo espaço para o sagrado. Vale lembrar, como ilustração significativa, o depoimento do professor norte-americano Paul Erdman: "A essência da América é a esperança de fazer dinheiro, depois fazer dinheiro com dinheiro, depois fazer muito dinheiro com muito dinheiro".
A cultura da organização pode condicionar atitudes e comportamentos numa linha materializante, mas, se considerarmos o milagre do homem - o Deus interior -, o seu potencial de sacralidade e de realização espiritual, podemos afirmar a presença divina nas condições de maior miséria humana. Deus manifesta-se no homem nas situações mais críticas. Há sempre alguém capaz de dar testemunho, de ser a esperança em meio ao caos, de hastear a bandeira e indicar o rumo.
A distorção conceitual é causa se não conscientizada de fracassos empresariais, onde Equipe e Cultura são incipientes, indefinidas, inconsistentes. Não há genuinamente equipes, mas agrupamentos, onde o estilo predominante é o mandar x receber.
A cultura geralmente manifesta-se pelo inconsciente coletivo - "um não sei o quê", o espírito do "não pode, pois a cultura não permite".
A coação e a restrição levam a um estado acomodatício, gerando clima de pobreza espiritual. Onde a sacralidade é freqüentemente confundida com o ritualismo, sem o exercício da essencialidade.
Pode haver pobreza espiritual e um rico ritualismo. Pode haver até igreja na empresa e ela não estar no coração do homem.
É preciso melhorar o homem e as organizações simultânea e sinergicamente. O esforço dissociado da melhoria organizacional leva comumente a frustração e recaídas. Evidente que haverá sempre um São Francisco de Assis e um Gandhi, capazes de superar estruturas hostis e fazer valer suas transcendências. Trabalhar a cultura é fundamental para acelerar o processo e efetivar as transformações radiais.
Na linha do desenvolvimento do homem na empresa, o sistema básico é o de educação gerencial, tendo como diretrizes a liderança integrada, a formação de equipes e o exercício do conceito de gerente educador. Quer isso dizer que é vital as lideranças estarem comprometidas com verdades comuns (o que integra lideranças são idéias, não tecnologias), serem orientadoras de equipes (a solidariedade grupal é condição para a normalidade do sistema) e exercerem função educativa (o líder ou é um educador ou não é líder).
Melhorar a organização significa preservar e desenvolver sua imagem pública através de um processo contínuo de Educação Empresarial, que importa numa Filosofia de Qualidade (espera-se que a empresa tenha não só bons produtos e serviços, mas que ela seja realmente boa como empresa), em Cultura Aberta e Enriquecedora (que os estímulos do ambiente empresarial sejam positivos à plenitude humana, pois daí decorrerá a produtividade efetiva), em Tecnologia Avançada (espírito receptivo à boa aplicação da tecnologia) e em Marketing (divulgação inteligente das propostas da empresa). Dentro desse contexto de forças, há um cenário propício à Transcendência na Empresa.
A Transcendência está nas pequenas coisas, pois ela está no coração do Homem. Quais são essas pequenas coisas que estão no pequeno dia-a-dia de cada um? Vejamos:
·
Dar informação
- Possibilitar formação
- Dignificar a pessoa, motivando
sua participação em equipe
- Criar ambiente favorável à
plenitude humana
o ao AMOR/SOLIDARIEDADE
- à ALEGRIA / BOM HUMOR
- ao BEM ESTAR / SAÚDE
- à REALIZAÇÃO / PROMOÇÃO
- à FÉ / TRANSCENDÊNCIA
·
Avaliar o desempenho
- Elogiar os acertos
- Corrigir os erros, com
reorientação
- Treinar, treinar, treinar
- Delegar autoridade
- Estimular a criatividade
- Saber gerenciar o tempo e
administrar conflitos
Isso significa que viver é conviver e que nossa existência é uma
aprendizagem contínua, à base de solidariedade (todos educam e são educados). A
transcendência realiza-se com a simplicidade e a essencialidade do ato de
respirar. É um equívoco comum pensar sempre em grandes providências, que,
exatamente por serem grandes, são sempre adiadas e nunca cumpridas. O segredo é
começar com pequenas coisas e ir progredindo. Estar aberto a consultas e
respondê-las com sinceridade, prestar todas as informações relevantes, elogiar,
orientar e ir criando o clima da confiabilidade e a cultura do amor. A
delegação de autoridade, por exemplo, é um instrumento fundamental de eficácia
gerencial, mas é, acima de tudo, um ato de amor de confiança, de respeito à
liberdade e à competência; é um forte estímulo ao autodesenvolvimento.
Igualmente a criatividade, que torna o homem, por sua contribuição pessoal,
co-partícipe da obra divina da perfeição.
Quando se exercita a autocracia no trabalho, inibe-se a inovação e
a transcendência. Ninguém ousa apresentar sugestões. Não se exercita o divino
que está em todos nós e que se chama exatamente criatividade. Criar é estar com
Deus. É realizar a transcendência. Na empresa e em qualquer situação de vida.
O sagrado está no homem, que é o construtor da organização.
Imagem e Indicação de outra leitura sobre o tema: http://www.ligiadenoronha.com/rubrica-eu-consciente/a-espiritualidade-no-trabalho/